quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Amigos.

Uma em cada três crianças nutre temporariamente uma relação existente apenas na fantasia – o que não é motivo para preocupação. O curioso é que também adolescentes e adultos, em especial idosos, usam esse recurso para superar fases difíceis.
por Inge Seiffge-Krenke



Vivemos tempos em que conversar com gente que nunca vemos não é nada incomum: perambulamos por chats, blogs e twitter e trocamos informações e segredos com pessoas com quem mantemos relacionamentos virtuais, às vezes bastante íntimos. Mas e quando uma criança “cria” um amigo imaginário – brinca, fala e até mora com ele, como se fosse real? Esse fenômeno, que surge principalmente entre 3 e 7 anos, não é tão raro. Quando pais e educadores percebem a existência desses companheiros invisíveis quase sempre ficam preocupados.

Mas os pais podem respirar aliviados, pois todos os estudos sobre esse fenômeno chegam ao mesmo resultado: não há motivo para preocupações! Os amiguinhos imaginários têm sido estudados de forma intensiva há muito tempo, nos últimos 100 anos, mas poucos psicólogos se dedicaram a esse tema. E há um ponto em comum: todos concordam que os amigos imaginários estimulam o desenvolvimento das crianças, podem suprir eventuais lacunas afetivas e ajudam na elaboração de questões psíquicas.

Para os mais novos, o amigo “de mentirinha” é quase sempre um companheiro de brincadeiras que pode estar “presente” também à mesa na hora das refeições, ser chamado pelo nome, mas não raramente acompanha a criança durante todo o dia. Alguns pesquisadores afirmam que praticamente todos nós temos um parceiro imaginário em um determinado estágio do desenvolvimento – porém, ele quase nunca é descoberto pelos adultos e a própria pessoa normalmente não se lembra disso mais tarde.

Não raro, pais, professores e terapeutas incomodam-se não apenas com o fato de as amizades imaginárias serem mantidas por um longo tempo, às vezes por anos, mas também com a nitidez com que as crianças parecem ver seus amiguinhos. Mas os pequenos sabem muito bem que seus parceiros não são reais e que só existem em sua imaginação. Ou seja: essas criações psíquicas podem ser claramente diferenciadas de fantasias patológicas, que ocorrem, por exemplo, nas psicoses. A criança nunca se sente indefensavelmente dominada pelo amigo que criou – pelo contrário, pode modelar, modificar e manipular sua invenção como quiser. E também determinar a duração desse “relacionamento”.Companheiros imaginários podem ter funções variadas.

Algumas crianças e jovens iniciam essa amizade quando se sentem sozinhos. O estudo de 2004 de um grupo de trabalho coordenado pela psicóloga Marjorie Taylor, da Universidade de Oregon, também aponta nessa direção. Os pesquisadores entrevistaram 152 crianças em idade pré-escolar e descobriram que aproximadamente 70% com idades entre 5 e 6 anos que tinham amigos imaginários eram primogênitos ou filhos únicos.

Os amigos inventados, porém, podem surgir quando a criança tem dificuldades em se submeter às regras dos adultos. Então o parceiro virtual simplesmente se permite fazer aquilo que é proibido a seu criador. Obviamente, os novos amigos são os culpados quando os pais descobrem a lata de bolachas saqueada ou são vítimas de alguma traquinagem. Muitas crianças até mesmo punem seus cúmplices invisíveis pelos delitos – o que naturalmente não impede os amigos de voltar a se portar mal.

Nenhum comentário:

Postar um comentário